Relatos de Israel: “Sob o som da angústia”
Repórter Flavia Travassos visita Israel e conversa com sobreviventes e familiares que transformaram a dor em memória e silêncio

Flavia Travassos
Israel - Fecho os olhos e consigo imaginar. Música alta, pulos, abraços, risadas. Gente feliz. Hoje, um festival de tristeza. Placas com as fotos e os nomes das vítimas cruzam a pista e dançam ao som do silêncio.
Mazal Tazazo estava lá. Pude estar frente a frente com ela graças a um milagre e a todo esforço que essa mulher de 35 anos fez para sobreviver. Tazazo teve as pernas amarradas e foi atingida por um golpe de fuzil na parte de trás da cabeça. Sangrou muito e se fingiu de morta. No caso dos dois amigos não era mentira: eles foram assassinados pelos extremistas. Enquanto ela lembrava detalhes daquela manhã de terror no bosque, às margens da Faixa de Gaza, percebi que Tazazo era interrompida pela necessidade de respirar. Com o olhar longe, de vez em quando ela parava para buscar o ar. É como se ele tivesse ficado perdido no dia 7 de outubro de 2023. Naquela hora, notei que a minha respiração também mudou e eu aprendi que angústia pode ser transmissível.

Talvez por isso, aquele menino ruivo a poucos metros de nós, também estivesse emocionado. Sentado no chão de terra que serviu de pista de dança durante o festival de música, ele chorava. Soluçava. De repente, se levantou apoiado aos amigos e abraçou uma daquelas centenas de placas. Era a que trazia a foto da prima, assassinada durante o ataque do Hamas. Para mim, aquele lugar, que virou um memorial, só tem o ritmo do choro dele e o da respiração dela. São os únicos sons que talvez toquem ali pra sempre.
