A força dos europeus no Oscar
Filme alemão é a única produção de língua não inglesa que concorre ao prêmio principal
Cleide Klock
Nos 95 anos de história do Oscar, 14 filmes falados em outras línguas sem ser o inglês, apareceram nas indicações da categoria principal: Melhor Filme. Dentre eles, apenas o coreano "Parasita" levou a estatueta mais cobiçada da festa e abriu as portas da esperança para os estrangeiros, que de forma constante, porém tímida, têm aparecido nas indicações. Neste ano, foi a vez do alemão "Nada de Novo do Front" (Netflix) figurar entre os dez concorrentes.
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Com nove indicações, empatado com "Os Banshees de Inisherín", e somente atrás de "Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo", o longa que mostra os últimos dias da Primeira Guerra Mundial, foi o grande vencedor do BAFTA, prêmio promovido pela academia britânica, levou sete troféus. O filme foi produzido pelo brasileiro Daniel Dreifuss.
"Foi um presente, se tornou o filme de língua não inglesa, mais premiado da história do BAFTA, inclusive Melhor Filme, é um sinal claro que o filme teve um diálogo com a Europa. Especialmente com tudo que está acontecendo na Ucrânia neste momento", nos contou Dreifuss que também esteve no palco para receber a estatueta.
Representatividade europeia
Desde 2015, com o movimento do #OscarsSoWhite (Oscar muito Branco) aumentaram as discussões sobre representatividade e diversidade na premiação e foi ampliada a participação internacional na escolha dos vencedores. O número de votantes dobrou nesses oito anos e, agora, são 9.570 pessoas ao redor do mundo que dão seus palpites.
"Eu acho que a Academia só tem a ganhar com esse novo foco, porque é o ideal para eles, em termos de audiência, de qualidade, de alcance do próprio Oscar, porque hoje em dia a audiência do programa está muito baixa. Eles estão loucos para saber o que podem fazer para trazer de volta o público que eles não têm mais", disse o jornalista da Folha de São Paulo em Los Angeles, Rodrigo Salem, que é membro da Associação Critics Choice.
Mas, quando visto de perto, esse número revela detalhes importantes: 2.200 são membros de fora dos Estados Unidos e desses, 1.400 são do bloco europeu, 63% do total.
Se é coincidência ou preferência, é difícil de apontar, mas entre os filmes que tiveram destaque nas indicações deste ano estão: o irlandês "Os Banshees de Inesherin" empatado com o alemão "Nada de Novo no Front", com nove indicações e "Triângulo da Tristeza", dirigido pelo sueco Ruben Ostlund (três indicações - Filme, Diretor e Roteiro Adaptado).
Além disso, na categoria de filme internacional, dos cinco indicados, quatro são europeus: "Nada de Novo no Front" (Alemanha), "Close" (Bélgica), "EO" (Polônia), "The Quiet Girl" (Irlanda). O quinto que completa a lista é "Argentina 1985".
Todos os cinco curtas de live-action também são europeus. Na categoria de Melhor Documentário, três das cinco produções, vêm dos países do bloco.
"Óbviamente a gente vai ver essa quedinha para Europa, é óbvio. Porque é a segunda maior fábrica de filmes para o Oscar, digamos assim. Não é nem de produção, mas de Oscar. O americano gosta muito das produções inglesas. A gente vê cada vez mais países como a Dinamarca e a Suécia apelando a uma sensibilidade do público, coisa que a gente não tinha antigamente. Os thrillers nórdicos hoje em dia são obrigatórios na Netflix, por exemplo. Então acho que muito disso também vem da mudança do próprio espectador, adquirida pelo streaming, já que o streaming trouxe muitos países para para casa das pessoas, que começam a se acostumar. Inclusive o próprio americano, que sempre foi meio avesso, à legenda", conta Salem.
"Justamente a beleza do cinema internacional é que você descubra universos que não são os seus, histórias narrativas, situações e sensibilidades que não são como você e sua realidade. E, ao mesmo tempo, se identifique com essas pessoas, e que o mundo é tão diverso e, ao mesmo tempo, tão próximo", finaliza Dreifuss.
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Tendência diversificada
Desde 2019, em todos os anos houve um longa não falado em inglês entre os finalistas ao Oscar de Melhor Filme. Apesar dessa quantidade de europeus votando, esta foi a primeira vez na última década, que um longa do bloco é indicado à principal estatueta.
Para o prêmio de Diretor, o último europeu a ganhar foi Michel Hazanavicius, por "O Artista" *, categoria que é sem dúvida a mais diversa da premiação na última década:
2022 - Jane Campion (Nova Zelândia) "Ataque dos Cães"
2021 - Chloé Zhao (China) "Nomadland"
2020 - Bong Joon-ho (Coreia do Sul) "Parasita"
2019 - Alfonso Cuarón (México) "Roma"
2018 - Guillermo del Toro (México) "A Forma da Água"
2017 - Damien Chazelle (EUA) "La la land"
2016 - Alejandro González Iñárritu (México) "O Regresso"
2015 - Alejandro González Iñárritu (México) "Birdman"
2014 - Alfonso Cuarón (México) "Gravidade"
2013 - Ang Lee (Taiwan) "A Vida de Pi"
"O Artista", que é uma produção francesa, ganhou cinco estatuetas, inclusive a de Melhor Filme, em 2012. Só não entra na lista, porque é um filme mudo.
Filmes de língua não-inglesa que já concorreram como Melhor Filme
A Grande Ilusão (1937, França)
Z (1969, França/Argélia)
Os Imigrantes (1971, Suécia)
Gritos e Sussurros (1972, Suécia)
O Carteiro e o Poeta (1994, Itália)
A vida é Bela (1997, Itália)
O tigre e o dragão (2000, Taiwan)
Cartas de Iwo Jima (2006, Japão) (apesar de ser falado a maior parte em japonês, a produção é americana)
Amor (2012, Austria, França, Alemanha)
Roma (2019, México)
Parasita (2020, Coreia do Sul)
Minari (2021, United States) (apesar de ser falado em coreano, a produção é americana)
Drive My Car (2022, Japão)
Nada de novo no Front (2023, Alemanha)
Onde assistir:
"Nada de Novo no Front" - Netflix
"Argentina, 1985" - Prime Video