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Brasil teve mais de 250 casos de assédio sexual no trabalho por mês em 2021

No total, 3.049 novos processos foram abertos nas Varas de Trabalho de todo o país, no ano passado

Brasil teve mais de 250 casos de assédio sexual no trabalho por mês em 2021
Campanha contra assédio sexual no metrô de Brasília
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Levantamento exclusivo feito pelo SBT News junto ao Tribunal Superior do Trabalho (TST) mostra que os registros de assédio sexual voltaram a subir, após o arrefecimento da pandemia e a retomada gradual do trabalho presencial. Em 2019, 2.805 processos foram abertos nas Varas do Trabalho de todo o país. Em 2020, os registros apresentaram uma leve queda para 2.455 processos. Mas os números de 2021 apontam uma tendência de aumento, já que foram 3.049 novas ações, uma média de 254 vítimas que buscam a Justiça por mês. 

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O assédio sexual é crime e está descrito no Código Penal como "constranger alguém com intuito de obter vantagem ou favorecimento sexual, prevalecendo-se o agente da sua condição de superior hierárquico ou ascendência inerentes ao exercício de emprego, cargo ou função". A presidente da Comissão Nacional da Mulher Advogada da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Cristiane Damasceno, explica que a forma mais comum de assédio sexual é a oferta de promoções e cargos em troca de algum tipo de relacionamento íntimo, e só se configura quando ocorre entre o chefe e um funcionário.

"Ele é até difícil de provar, porque as pessoas não fazem prova do assédio. Não manda uma mensagem de WhatsApp, não manda um e-mail, que seriam provas cabais de que o assédio sexual foi praticado. Geralmente acontece nas conversas de pé de ouvido, no meio do corredor. Fica a palavra da vítima contra a palavra do autor", exemplifica Cristiane. A pena para o assédio sexual é de um a dois anos de detenção, sujeita a acréscimo em até um terço se a vítima for menor de 18 anos. 

A advogada avalia que a queda de registros de assédio sexual, durante a pandemia, pode ter sido causada pela distanciamento físico, e que a volta ao ambiente do trabalho automaticamente leva a um aumento dos processos. Mas Cristiane também lembra que muitas pessoas foram demitidas durante a pandemia e, fora do emprego, os trabalhadores deixaram de ter medo de denunciar e sofrer represálias.

Mesmo com o aumento, a especialista acredita que os números ainda podem ser subestimados, já que muitos empregados ainda têm medo de denunciar. "Tem uma cifra oculta, as pessoas têm medo de falar. Criou-se uma cultura de que as pessoas têm que aguentar. Mas não é. Ninguém é obrigado a ficar sendo humilhado, destratado, emocionalmente oprimido sob o argumento de que aquilo faz parte do mercado de trabalho", ressalta.

Os casos de assédio moral também apresentaram alta. Em 2020, foram 50.391. Já em 2021, foram 52.936 novas ações. No entanto, o aumento não é o suficiente para atingir os patamares anteriores à pandemia. Em 2019, foram registrados 56.169 casos de assédio moral. Diferentemente do assédio sexual, o moral não é crime e pode ocorrer entre colegas, e não apenas com o superior hierárquico. 

Cristiane Damasceno
Cristiane Damasceno avalia que há uma subnotificação de casos | Reprodução/SBT

Reforma trabalhista

Na série histórica de abertura de processos nas Varas do Trabalho, que traz dados desde 2015, chama a atenção a queda no número de processos a partir de 2018. Em 2017, foram registrados 155.762 processos por assédio moral. No ano seguinte, foram 56.795 registros, uma redução de mais de 60%. Já nos registros de assédio sexual, a diminuição foi de 5.161 para 2.379. Especialistas avaliam que a reforma trabalhista é a principal razão para a queda brusca. Em 2017, o Congresso Nacional aprovou mudanças na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), que foram sancionadas pelo então presidente Michel Temer (MDB). Entre elas, estava a previsão de que o trabalhador que recorresse à Justiça e perdesse o processo teria que pagar os honorários do advogado da outra parte.

A advogada trabalhista Vera Barbosa afirma que a mudança fez com que os empregados que não tinham provas ou faziam pedidos exorbitantes deixaram tais práticas de lado por receio de terem despesas ao final do processo. Segundo ela, a medida colocou freio em uma indústria de indenizações trabalhistas que existia. "A reforma trouxe um freio, porque ela colocou a responsabilidade do empregado pagar os honorários da empresa, caso ele perdesse, os honorário sucumbenciais. Teve também um grande receio de honorários periciais, que não são valores baixos", relata Vera.

Contudo, em outubro do ano do passado, o Supremo Tribunal Federal (STF) declarou, por 6 votos a 4, a inconstitucionalidade do trecho da reforma trabalhista que previa o pagamento de perícia e dos honorários advocatícios. A Corte entendeu que não cabe o pagamento aos beneficiários da Justiça gratuita. Segundo a especialista em direito do trabalho, a revisão da lei também pode ser uma das causas da retomada das ações por assédio mora e sexual e, juntamente com ela, a volta de questionamentos indevidos na Justiça trabalhista. "A gente tinha Tribunal Regional do Trabalho que já reconhecia que essa previsão da reforma trabalhista era inconstitucional, diferentemente de outros tribunais. Quando o STF tomou a decisão, colocou por terra a posição de alguns tribunais que ainda condenavam os empregados. Então, realmente os pedidos voltaram a ser astrônomicos."

Vera Costa
Para Vera Barbosa, muitos trabalhadores deixaram de ir à Justiça após a reforma trabalhista | Reprodução/SBT

Convenção 190

Em junho do ano passado, entrou em vigor a Convenção 190 da Organização Internacional do Trabalho, que traz diretrizes para a eliminação do assédio e violência no ambiente de trabalho. O texto prevê, por exemplo, o combate aos abusos físico, psicológico, sexual ou econômico, inclusive por questões de gênero, contra qualquer trabalhador, tendo vínculo formal com empresas ou não. Os países signatários da convenção também ficam obrigados a fiscalizar, dar apoio legal às vítimas e promover campanhas de capacitação. 

No entanto, o governo brasileiro ainda não ratificou a adesão do país à norma da OIT. Em março, o Tribunal Superior do Trabalho aprovou uma moção de apoio ao regramento. Agora, o presidente da Corte, ministro Emmanoel Pereira, faz uma campanha junto aos demais Poderes para que documento seja aprovado pelo Brasil. "Queremos mostrar ao mundo que o Brasil é um país que respeita a dignidade do trabalhador. Essa é uma ação que extrapola o ambiente do trabalho, se refletindo em toda a sociedade, que ganha em qualidade de vida, respeito e harmonia", afirma Pereira. Na última 4ª feira (6.abr), o magistrado esteve com o presidente Jair Bolsonaro (PL) para fazer o apelo. 

A advogada Cristiane Damasceno ressalta que a convenção é importante para padronizar o conceito de assédio. "A OIT lançou uma convenção que definiu o que é assédio moral, porque fica cada um interpretando a situação do jeito que quer. Se pega uma pessoa que é xingada o tempo inteiro, um juiz pode interpretar como sendo assédio moral e outro pode interpretar como algo normal, que o trabalhador tem que suportar", detalha Cristiane. 

Como denunciar

A orientação aos trabalhadores que vêm sendo submetidos a situações de assédio moral ou sexual é que busquem, inicialmente, o RH ou ouvidoria de empresa na qual trabalham. Se a situação não for resolvida, a vítima pode procurar o sindicato da categoria, o Ministério Público do Trabalho ou o Ministério do Trabalho e Previdência por meio das superintendências regionais. O trabalhador ainda pode buscar auxílio jurídico e entrar com uma ação na Justiça do trabalho. São consideradas provas de assédio mensagens, gravações telefônicas, e-mails, bilhetes e relatos de testemunhas.

A advogada Vera Barbosa ressalta que a empresa é quem deve coibir os casos de assédio e a melhor forma de se fazer isso é promovendo campanhas de conscientização: "É importante a empresa fazer conscientização, fazer treinamentos, explicar aos seus empregados essa situação. E é importante que a empresa coiba, sempre que tiver conhecimento".

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