"A gente não cuida do pobre se ficar olhando a política fiscal", diz Lula
Presidente eleito discursou em encontro com catadores de materiais recicláveis nesta 5ª feira
O presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), disse nesta 5ª feira (15.dez) que participará de um encontro com pessoas em situação de rua em São Paulo após tomar posse e sugeriu que seu governo fará um estudo "profundo" sobre as condições de quem vive na rua, para possibilitar à gestão, então, ajudar esses indivíduos. As declarações foram dadas em discurso no Natal dos Catadores de Recicláveis, na capital paulista.
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"Se a gente não tiver um estudo profundo sobre a razão pela qual eles estão na rua, a gente não tem solução e vai sempre tratá-los como vagabundo, e na verdade vagabundo é quem não olha para essas pessoas com o coração cheio de amor para a gente poder cuidar", pontuou o petista. "Eu digo sempre que para cuidar do povo pobre é preciso ter muito coração. A gente não cuida do pobre se a gente ficar olhando os dados estatísticos, se a gente ficar olhando a política fiscal do governo, se a gente ficar olhando o orçamento da prefeitura, se a gente ficar olhando o orçamento do estado. Sempre haverá prioridade mais importante que os pobres. Sempre haverá alguém fazendo pressão que vocês não conseguem fazer".
Na sequência, assumiu o compromisso de que seu governo dará "uma vida decente" às pessoas em situação de rua vivendo abandonadas "como se fossem animais pelos viadutos de São Paulo, embaixo das pontes". "E agora está fazendo paralelepípedo embaixo das pontes, criando obstáculo, colocando coisa de ferro para não ter espaço para vocês dormirem. Ou seja, não é que eles não cuidam. É que eles não querem nem que vocês tenham direito a deitar embaixo de uma ponte. Ou seja, não tem nenhum significado, não tem nenhum sentido humanista, nenhum sentido de paixão, de amor, de compreensão sobre o que vocês vivem nesse país", complementou.
Ao final do discurso, pediu ao padre Júlio Lancellotti, um dos presentes e conhecido por ajudar pessoas em situação de rua, para preparar "uma boa pauta de reivindicação" e explicou o motivo: "para que o Governo Federal faça um estudo profundo sobre as condições de cada homem, de cada mulher, a sua origem, a sua decisão, para que a gente possa então ajudar essas pessoas [sem lar]".
No evento, antes de discursar, Lula recebeu uma homenagem -- selo amigo dos catadores 2022 -- e um documento com demandas dos catadores de materiais recicláveis, entre as quais a implementação de uma Secretaria da Reciclagem no Ministério do Meio Ambiente e a revogação de vários decretos. A presidente do PT, deputada federal Gleisi Hoffman (PR), disse que Lula olhará o documento "com carinho".
Ainda no evento, pontuou: "Governo só tem sentido se olhar para o povo, então nós vamos ter de novo os agentes ambientais nas políticas públicas. Vai estar lá no Meio Ambiente, no Conana, as nossas estatais, a porta da Itaipu vai estar aberta de novo para vocês. Nós queremos que os programas e projetos que nós fizemos voltem e voltem com mais força". Ela discursou antes do presidente eleito, assim como Lancellotti, Anderson Gomes Miranda, coordenador do Movimento Nacional da População de Rua, o futuro ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), entre outros.
Segundo o padre, "a aporofobia está matando o nosso povo pela violência, pelo desprezo". "Nós esperamos que hoje, no Congresso Nacional, seja derrubado o veto do presidente Bolsonaro, que vetou o projeto aprovado de veto às intervenções hostis na arquitetura, que muitos covardes não têm coragem de fazer este decreto. É uma lei, o presidente vetou", acrescentou. Ele se referia à chamada Lei Padre Júlio Lancellotti.
Ainda em seu discurso, afirmou que os prefeito de Recife, João Campos (PSB), e Alfenas (MG), Fábio Marques Florêncio, sancionarão leis similares nesta semana, e pediu a Lula para implementar uma Secretaria Nacional para a População em Situação de Rua e realizar mutirões para que todas as pessoas nessa situação tenham o Cadastro Único para Programas Sociais (CadÚnico). "Queremos que a renda básica seja aprovada e que a população em situação de rua receba essa renda. E que não haja programas de tutela, mas de autonomia, que as pessoas tenham direito à cada, tenham direito a onde morar. E que com você presidente cesse a repressão e cesse a violência contra o povo da rua", completou.
Anderson Gomes Miranda, por sua vez, disse, que no atual governo, as pessoas em situação de rua "não tem mais diálogo". "O único diálogo é internação compulsória, é guarda municipal em cima da população de rua, é jato d'água todo dia no Brasil, é prendendo". Já Haddad falou sobre sua tarefa no Ministério da Fazenda: "Ele [Lula] falou 'Haddad, ministro da Fazenda tem que ter uma preocupação: colocar o pobre no orçamento e o rico no imposto de renda. Então ele me convidou para essa nova tarefa, e se a gente tiver o mesmo êxito que teve quando ele nos colocou a tarefa da educação, nós vamos ter um país mais justo, que é o que nós precisamos".
Estavam presentes no evento também o vice-presidente do PT, deputado federal Márcio Macêdo (SE), a ex-prefeita da capital paulista Marta Suplicy, o advogado Marco Aurélio Carvalho, coordenador do Grupo Prerrogativas, e o vereador de São Paulo Eduardo Suplicy (PT).
Solução definitiva
Em determinado momento de seu discurso, Lula discorreu sobre a dificuldade das pessoas em situação de vulnerabilidade social dialogarem com o chefe do Executivo: "O povo pobre, o povo de rua, os catadores e tantos outros milhões de brasileiros não tem como chegar até o Governo [Federal]. Eles às vezes não chegam ao prefeito, ao governador, e muito menos eles chegam ao presidente da República. Eu quero assumir o compromisso com vocês de que não serão vocês que terão que ir até o presidente da República. Sou eu, presidente da República, que tenho que vir até vocês, para que a gente possa conversar e tentar encontrar uma solução definitiva para os moradores de rua e para as pessoas mais humildes desse país".
Ele prometeu também que sua gestão fará o que estiver ao alcance dela para dar aos catadores de materiais recicláveis a cidadania que merecem.