Falta de programação infantil na TV aberta afasta crianças de conteúdos educativos e culturais
Em comunidades ribeirinhas e rurais sem acesso à internet, o público infantil não tem opção e sente os efeitos da falta de conteúdos próprios na TV
do SBT Brasil
Para chegar à comunidade ribeirinha no arquipélago do Marajó, no Pará, é preciso enfrentar uma viagem de duas horas de lancha a partir de Belém até Cachoeira do Arari, às margens do rio Caracará. Nesse local isolado, vivem cerca de 3 mil pessoas, onde o acesso a conteúdos infantis é praticamente inexistente.
Cercadas por rios e pela tranquilidade da floresta, crianças crescem sem contato com programas voltados para sua faixa etária. Isto porque, desde 2014, uma resolução do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda) restringe a publicidade infantil. A medida buscava proteger os menores, mas teve um efeito colateral: sem anunciantes, a produção de programas infantis se tornou inviável na TV aberta, ainda a principal forma de entretenimento em muitas regiões do país.
Nas grandes cidades, o fim da programação infantil migrou as crianças para a internet. Já nas regiões ribeirinhas, onde o sinal de celular é fraco ou inexistente, milhares ficaram sem opções.
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Segundo dados recentes do IBGE, a TV aberta alcança 94,3% dos lares brasileiros. No entanto, a internet de alta qualidade, necessária para consumir vídeos, chega a apenas 35% da população — e esse número é ainda menor na Região Norte, com apenas 11% de cobertura.
Na comunidade dO Caracará, uma professora conta que evita usar a TV em casa por não encontrar programação apropriada para os filhos. “Se a televisão tiver uma programação infantil que venha nos ajudar, com certeza será muito útil para o desenvolvimento das nossas crianças”, afirma Rodh Costa.
O pequeno Obadias Costa, de 12 anos, sente falta dos desenhos animados. “Faz bastante falta. Gostava muito de ver desenho”, diz ele, que hoje só assiste a jogos de futebol. Já Samuel, de 10 anos, brinca no rio e joga bola, mas não está habituado a ver TV com conteúdos próprios para sua idade. “Quando vê televisão, vê jornal...”, comenta.
Para a socióloga Norma Barbosa, que estuda o impacto da mídia na formação cultural infantil, o desaparecimento desses programas compromete o repertório cultural das crianças. “Quando as crianças vão para frente da televisão, é para ver novela ou programas violentos, que não são adequados para elas”, alerta. Ela reforça que a infância precisa se ver representada na mídia para fortalecer sua identidade.
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A Associação Brasileira de Anunciantes defende que a publicidade voltada ao público infantil pode ser adaptada, garantindo a proteção das crianças sem inviabilizar economicamente a produção de conteúdo para esse público. “Ao invés de proibições radicais, é necessário encontrar um equilíbrio”, afirma Sandra Martinelli, CEO da entidade.
Enquanto isso, as crianças do Caracará continuam sem saber o que é se reunir em frente à TV com a família para assistir a um desenho animado.