Personagens de junho: Wesley Rosa, adepto à tática black bloc
Conheça a história do jovem mascarado que, 10 anos depois, virou líder comunitário na periferia de SP
Emanuelle Menezes
Fabio Diamante
Logo no início do ciclo de protestos de junho de 2013, que começou com uma reivindicação do Movimento Passe Livre pela redução no preço da passagem do transporte público, chamou a atenção a atuação de manifestantes mascarados, adeptos de uma tática até então desconhecida no Brasil. Eram os black blocs.
Segundo Angela Alonso, socióloga e autora do livro Treze: A política de rua de Lula a Dilma, a estratégia utilizada pelos black blocs era a de "espetacularização do próprio ativismo", usando da violência contra objetos e edifícios que representem o estado nacional e o capitalismo para protestar.
Dez anos depois, um manifestante adepto da tática black bloc em 2013 e atual líder comunitário no bairro Jardim Apurá, extremo da zona sul de São Paulo, falou ao SBT News sobre os protestos que tomaram as ruas e mudaram o país.
Wesley Silvestre Rosa, que hoje luta pela preservação do Parque dos Búfalos, na região da Represa Billings, acredita que a resistência nascida há dez anos teve resultado. "Todo mundo que participou daquela época de alguma forma teve algum resultado de mudança dentro de si", diz ele.
"A minha participação em 2013 me gerou mais coragem para lutar aqui na minha comunidade. Eu aprendi muito nas ruas, aprendi muito com os movimentos sociais, a fazer assembleias, a fazer reuniões, a organizar a população e a trazer isso para a minha comunidade, para se defender de atitudes que não são legais aqui na periferia", afirma o ativista.
Tática black bloc
Wesley conta que foi a violência da Polícia Militar que fez nascer a reação dos black blocs. "O primeiro grande ato, do dia 6 de junho, ninguém usou da tática black bloc, e o ato foi extremamente reprimido ali na Avenida Angélica, Nove de Julho. Todo mundo teve que se espalhar para se proteger".
Entre deixar as ruas ou continuar os atos, a opção desses manifestantes foi pela resistência. E a tática black bloc surgiu então como uma defesa à violência e à perseguição sofridas por quem protestava. Mas o ativista lembra que não havia um grupo organizado de mascarados. Os adeptos da tática eram participantes que, se sentindo oprimidos pela PM, reagiam com o objetivo de "manter as ruas ativas e as pessoas mais seguras".
"Quando você é oprimido, não tem como você responder se não você usar da mesma força. Você, enfim, com gás lacrimogêneo na cara, com balas de borracha apontada pra ti, muitas vezes com arma letal... você entregar flores para os caras. Você tem que recuar e se defender. E para manter as ruas naquele ano foi extremamente necessário que várias pessoas se disponibilizassem", declara.
O líder comunitário explica que os primeiros protestos eram contra o capitalismo, que onerava as cidades e aumentava o custo de vida, incluindo o aumento de R$ 0,20 no preço da passagem. Vem dessa crítica ao capital os atos que chamaram mais atenção em 2013: o ataque às agências bancárias e concessionárias de veículos.
"Por isso a quebra de bancos, concessionárias multimilionárias, essa era a forma de chamar a atenção para uma pauta que não queriam escutar. Os bancos estavam lucrando muito, enquanto a população estava padecendo. As concessionárias estavam vendendo muito, enquanto a população estava morrendo. Então, era uma forma de chamar a atenção para o que estava acontecendo", afirma Wesley.
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Legado de junho
Para o líder comunitário, a possibilidade de gratuidade no transporte público de São Paulo, que voltou ao debate político com audiências públicas na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara de Vereadores em 2023, mostra que o legado de junho de 2013 é enorme.
"Hoje a gente discute a possibilidade de um passe livre para uma cidade como São Paulo. 2013 deixou um legado enorme, uma crescente enorme de movimentos sociais, hoje nós temos movimentos sociais em praticamente todos os bairros, várias vertentes de movimentos sociais", declara Wesley.
O ativista lembra que ele mesmo mudou muito nos últimos dez anos. O Wesley que ficava na internet, de forma anônima, denunciando a construção de prédios no Parque dos Búfalos -- uma área de manancial -- e que depois se mascarou para protestar contra o aumento das passagens, hoje mobiliza a periferia do Jardim Apurá por melhorias dos serviços públicos. Com nome, sobrenome e cara limpa.
"Eu tive que pagar uma multa de R$ 24,2 mil por mostrar o rosto, por ter plantado árvores aqui no Parque dos Búfalos", recorda o jovem, que completa:
"Sou líder comunitário, emito ofício, vou ao Ministério Público se for necessário, tenho 53 inquéritos que acompanho [...] Nós ganhamos o direito de uso das áreas para fins de moradia na região do Apurá, para garantir a vida das pessoas aonde elas escolheram viver".
Veja o primeiro episódio da série Atos de junho: 10 anos depois, do SBT Brasil, na íntegra: