Comer ou estudar: o dilema que fez disparar a evasão escolar na pandemia
43% dos jovens pensaram em abandonar os estudos em 2021; professores tentam analisar as causas
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Em meio a tantas mudanças e impactos provocados pela pandemia do coronavírus, a educação pública foi uma das áreas mais afetadas. Segundo dados da pesquisa "Juventudes e a Pandemia do Coronavírus" do Conselho Nacional de Juventude (Conjuve), o número de jovens que pensou em abandonar os estudos durante a pandemia subiu de 28% para 43% no ano de 2021.
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O conhecimento é a melhor maneira de jovens alcançarem maiores oportunidades. Porém, a realidade de muitos que moram em regiões periféricas impõe dificuldades para a rotina estudantil. Pesquisa realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia (IBGE) aponta que jovens entre 15 e 29 anos da cidade de São Paulo são os mais afetados pela falta de instrução educacional ou ensino fundamental incompleto, com menos de 15% deles tendo concluído o ensino superior. Nas regiões Sul e Leste, por exemplo, somente 4% da população está incluída na porcentagem correspondente àqueles que possuem graduação, e menos de 35% completou o ensino fundamental.
O SBT News procurou profissionais da rede pública de ensino para esclarecer o aumento desse número e também para entender quais as iniciativas propostas para evitar a evasão no setor educacional. Vania Crevelaro, professora de ensino médio na escola pública Zeicy Apparecida Nogueira Baptista -- em Taboão da Serra, zona Oeste de São Paulo --, avalia que, apesar da existência de projetos comunitários e até mesmo incentivo nas escolas públicas, "neste cenário, os esforços devem ir além dos muros da escola, cabível ao poder público estruturar ações que possam garantir a permanência do aluno dentro dela, uma vez que o jovem não deveria ser obrigado a escolher entre comer, pagar as contas e estudar".
Por se tratar de uma população predominantemente humilde, uma das maiores justificativas para a evasão é a necessidade financeira das famílias. Uma das fundadoras do Movimento Conexão Favela, Carol Polesca Muccida salienta que "esse abandono pode ser reflexo da necessidade financeira da família que gera o aumento da informalidade/precarização no trabalho". Carol afirma ainda que os jovens precisam ajudar a complementar a renda dentro de casa e acabam optando pelo trabalho que têm disponível de forma imediata.
Fundado em outubro de 2019, em parceria com a Associação Jardim Peri -- situada na Zona Norte da cidade de São Paulo --, o Movimento Conexão Favela surgiu com o propósito de empoderar o jovem da comunidade por meio da educação e do acesso à tecnologia. Mas, de acordo com a fundadora, o agravamento da pandemia impactou as prioridades do projeto. "Acabamos distanciando do nosso propósito que é a educação, pela necessidade maior que era a fome na região", justificou Carol.
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"A fome, ela preexiste", pontuou o especialista em educação Fernando Cássio, professor de políticas educacionais na Universidade Federal do ABC (UFABC). Ele avalia que, se é a fome, a pobreza e as faltas de políticas públicas que tiram os estudantes da escola, é importante garantir políticas públicas. "Seja para manter o ensino remoto, caso as escolas suspendam as aulas de novo, ou para manter os estudantes em sala de aula combatendo essa pressão econômica que tira os estudantes dos colégios e os leva para um trabalho precário para manter a renda em casa."
Ensino remoto
Outro fator nessa complexa equação provocada pela pandemia é o sistema educacional remoto ou híbrido -- em que os alunos têm aulas presenciais e on-line --, no qual a falta de internet e de recursos tecnológicos viram mais uma bairreira para os jovens em situação de vulnerabilidade. A professora Vania Crevelaro relata que não foram poucos os alunos que tiveram dificuldades. "Mesmo tendo os dados [de internet] patrocinados pelo governo [estadual], a maioria dos chips ofertados não funcionou", resumiu.
Além da tecnologia, outro ponto que dificulta o acesso ao ensino remoto é o ambiente domiciliar precário. Segundo Fernando Cássio, a casa é um fator importante, visto que estudantes mais pobres muitas vezes não têm outro espaço adequado para o estudo.
O SBT News entrou em contato com a Secretaria da Educação do Estado de São Paulo (Seduc-SP) para obter mais informações sobre a evasão escolar. Porém, a pasta informou que até o momento não possui detalhes sobre os dados apresentados. No entanto, garantiu a existência de projetos voltados para o combate à evasão na rede, como é o caso do "Bolsa do Povo", benefício que oferece anualmente até R$ 1 mil para alunos do ensino médio e do 9º ano do ensino fundamental da rede estadual, inscritos no Cadastro Único, mediante frequência mínima de 80% nas aulas. O intuito da iniciativa é diminuir os problemas econômicos dos jovens sem comprometer o desempenho e o interesse estudantil.