Produtores de fruta em SP já estimam impacto de tarifa dos EUA e buscam novos mercados
Taxação anunciada por Trump inviabiliza exportações para os EUA e produtores de Valinhos apostam em países da Ásia
Simone Queiroz
Natalia Vieira
O pé carregado, mesmo em pleno inverno seco do interior de São Paulo, sinaliza uma safra promissora: caixas e mais caixas de figo. A mesma expectativa vale para as goiabas vermelhas que aguardam o momento certo para a colheita.
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A cidade de Valinhos, a 90 km da capital paulista, conhecida como a capital do figo roxo, é responsável pela maior parte da produção nacional da fruta. Na fazenda onde foi realizada a reportagem, 60% do figo cultivado é exportado. Os Estados Unidos estavam nos planos futuros do produtor, mas agora, com a nova política tarifária, esses figos deverão ganhar outros destinos.
A mudança repentina veio após o presidente americano Donald Trump anunciar uma taxação de 50% sobre produtos brasileiros. O dono da fazenda, que há meses estudava regras e tentava abrir o mercado americano, agora repensa a estratégia.
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"Vamos dar uma parada nessa prospecção dos Estados Unidos. Caso isso realmente aconteça, não tem por que a gente nem fazer as certificações necessárias para mandar pra lá, porque acho que vai ficar inviável por causa de valores", afirmou o produtor rural Luis Carlos Christofoli.
Hoje, uma caixa de figo poderia ser exportada a US$ 10. Com a nova tarifa, o valor subiria para US$ 15, tornando o produto menos competitivo em comparação a frutas de países não taxados.
Até maio, segundo a Câmara Americana de Comércio para o Brasil, as exportações brasileiras para os Estados Unidos somaram quase US$ 17 bilhões – um aumento de 5% em relação ao mesmo período do ano passado. O novo decreto atinge principalmente os setores de petróleo, ferro, aço, café, aeronaves, carnes e frutas, especialmente a laranja.
Empresas de logística também sentem os reflexos da decisão. Uma delas, localizada no Rio de Janeiro, que tem de 15% a 20% do faturamento vinculado ao mercado americano, teme uma retração nos negócios e possíveis cortes de pessoal.
"A gente também fica preocupado, afinal são uns 15 a 20% da nossa mão de obra utilizada", disse Donato Nunes, empresário do setor de logística internacional.
A Confederação Nacional da Indústria (CNI) defende o diálogo entre os dois países para tentar reverter a medida, prevista para entrar em vigor no dia 1º de agosto.
"Nesses últimos três meses não existiu qualquer fato econômico que justificasse uma medida desse tamanho, que pudesse elevar a tarifa do Brasil de um piso de 10% para um teto de 50%", afirmou Ricardo Albin, presidente da CNI.
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A Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil também se posicionou, alertando que a economia e o comércio não devem ser afetados por razões políticas. Ainda assim, o setor vive um momento de incerteza, já que o histórico de Donald Trump mostra que nem sempre suas ameaças se concretizam.
"Historicamente o que ele tem feito tanto com o México quanto com a União Europeia é isso: você ameaça, amplia o prazo de negociação e chega num consenso muito inferior", explicou o economista José Thomaz Alfaix, da Bravo Investimentos.
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Ele estima que, caso as tarifas se mantenham, o impacto econômico pode chegar a US$ 15 bilhões. No entanto, existem alternativas.
"Quando a gente pega café, laranja, soja – que são os bens que mais exportamos para lá –, são facilmente redirecionáveis, seja para o mercado interno, Europa ou China", avalia Alfaix.
É o que pretende fazer o produtor de figo e goiaba em Valinhos. "Tentar partir pra Ásia, alguma coisa… China, né? Que a gente sabe que gostam da fruta, talvez seguir nesse caminho".