"Vitória dos que acreditam na democracia", diz defesa de Lula sobre decisão da ONU
Segundo advogados, governo deve dizer à ONU qual medida adotará para reparar danos causados ao petista
Guilherme Resck
O advogado de defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), Cristiano Zanin, classificou a decisão do Comitê de Direitos Humanos da ONU divulgada nesta 5ª feira (28.abr) como "histórica" e "uma vitória não apenas do presidente Lula, mas de todos aqueles que acreditam na democracia e que acreditam no Estado de direito". A declaração foi feita em entrevista coletiva concedida nesta 5ª para detalhar a decisão.
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O Comitê -- formado por 15 juízes independentes -- definiu que o processo penal contra o ex-presidente, conduzido pelo ex-juiz Sergio Moro (UNIÃO), violou -- de forma "grosseira", nas palavras de Zanin -- quatro artigos do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos: 9, 14, 17 e 25. Segundo o advogado de Lula, "são artigos que dizem respeito ao direito de todo e qualquer cidadão a um julgamento justo e imparcial, ao direito à privacidade e também ao de ter os seus direitos políticos respeitados".
A análise do caso por parte do grupo da ONU foi realizada entre os dias 28 de janeiro e 25 de março deste ano, no âmbito de uma queixa apresentada pela defesa de Lula ao Comitê em 28 de julho de 2016. Na época, o Supremo Tribunal Federal (STF) havia solicitado todos os processos envolvendo Lula, no âmbito da Lava Jato, que estavam na primeira instância em Curitiba, por causa da interceptação de uma conversa entre o petista e a então presidente, Dilma Rousseff (PT), cujo sigilo foi derrubado por Moro. O STF desautorizou o uso do conteúdo da interceptação no respectivo processo e devolveu o restante para Curitiba.
Em sua decisão, agora, o Comitê determina ainda que o Governo Federal brasileiro lhe envie, no prazo de 180 dias, um documento com medidas que adotará para reparar os danos causados a Lula por causa das violações e para evitar que elas voltem a ocorrer, e publique -- em português -- o resultado da análise, de 25 páginas; este está sendo traduzido pela defesa de Lula. Segundo Zanin, se o Executivo não cumprir com a determinação, ficará "inadimplente no plano internacional em relação a suas obrigações" e poderá ser punido, porque, no passado, subscreveu o pacto e, por meio do Decreto n° 592/1992, aderiu à jurisdição.
Enquanto o processo tramitava na ONU, o Brasil se manifestou sete vezes. Em todas, disse o advogado, reconheceu a legitimidade do comitê para analisar o caso e dar uma resposta. Ele acrescentou que essa foi a primeira vez que um cidadão brasileiro apresentou queixa ao grupo. Além disso, ele e a advogada Valeska Martins -- a qual também assinou a queixa, assim como Geoffrey Robertson -- criticaram a Lava Jato, Moro e Dallagnol. "Nós conseguimos não apenas no Brasil o reconhecimento de que tudo era ilegal e arbitrário em relação ao ex-presidente Lula, mas também em uma corte mundial, que é o comitê da ONU, reconhecer que a Operação Lava Jato, o ex-juiz Sergio Moro e o ex-procurador Deltan Dallagnol atuaram de forma ilegal, arbitrária e afrontando um tratado internacional da ONU", pontuou Zanin.
De acordo com Valeska, o combate à corrupção promovido pela Lava Jato foi "arbitrário" e não se pode atuar dessa maneira para fazê-lo. Próximo do final da coletiva, Zanin acusou Moro e Dallagnol ainda de, na Lava Jato, terem usado "suas próprias redes sociais como uma forma de demonizar e atacar aqueles que estavam sendo investigados e acusados". "Isso por si só já é uma atitude ilegal".
A defesa de Lula espera que o Governo Federal cumpra imediatamente a determinação do Comitê de Direitos Humanos da ONU. Entre os materiais que enviaram ao grupo no curso da análise da queixa, estiveram, por exemplo, mensagens obtidas por meio da Operação Spoofing. Quando protocolaram a reclamação, citaram prisão coercitiva de Lula autorizada por Moro e intercepção dos telefones do petista, Dilma e dos advogados do ex-presidente como provas de violação do Pacto Internacional. Zanin relembrou que, em 2018, o Comitê emitiu uma liminar segundo a qual o governo não poderia impedir Lula de participar das eleições daquele ano. "Essa liminar acabou sendo descumprida", completou. A decisão foi recebida com "muita emoção" por Lula, segundo o advogado. Eles foram informados sobre ela na 4ª feira (27.abr).
Em nota, Sergio Moro destacou que o entendimento apresentado no relatório não reflete a opinião de um órgão central da ONU. Também de acordo com ele, "votos vencidos" de ministro do STF mostram que sua "atuação foi legítima na aplicação da lei, no combate à corrupção e que não houve qualquer tipo de perseguição política".