Usar dinheiro de forma correta vai acelerar sua retomada
A forma de utilização de recursos financeiros pode levar empresas, e pessoas, ao caos, ou salvá-las
Observo, com frequência, sócios e executivos de empresas, de todos os tamanhos, perseguindo sonhos, presos a conceitos ultrapassados. Por exemplo, adquirindo imóveis industriais ao invés de alugá-los, mantendo produtos obsoletos no portfólio, ou estoques sem giro parados nas prateleiras, e por aí vai? Investindo dinheiro em ações não prioritárias, dinheiro esse, por vezes escasso, e extremamente necessário para o bom funcionamento dos negócios.
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Um exemplo clássico deste tipo de alocação incorreta pode ser observado em empresas que, mesmo com dificuldade de capital de giro, continuam investindo em pesquisa e desenvolvimento, em expansão, em ações de marketing sem métricas claras de retorno. Isso parece fazer sentido para você?
Especialmente se você estiver à frente de uma empresa com restrição de caixa (ou passando por cenário de recessão), seu foco total deve ser na preservação da atividade atual da empresa, e não em usar recursos para financiar ações que vão gerar resultados futuros.
Isso significa que você precisa priorizar os pagamentos das contas que "param" a empresa, caso não sejam pagas! Pense, com calma e imparcialidade, se aquela conta que você está pensando em pagar é, realmente, essencial.
Você precisa saber quais saídas de caixa mantêm a empresa de pé, e quais podem ser postergadas.
Decidir entre pagar uma ou outra despesa pode ser desafiador (todos os que não forem pagos argumentarão que suas contas são importantes, e a pressão interna e externa serão grandes), mas você precisa tomar essa decisão com frieza, e parâmetros bem definidos, sem subjetividade.
O melhor critério, para priorização, sempre será a avaliação imparcial, de qual conta vai manter o negócio rodando. Não ceda a pressões.
Atender a carteira de pedidos que já estão colocados, por clientes que já são fiéis, é muito mais importante, e inteligente, do que realizar ações promocionais ou campanhas publicitárias para atrair novos clientes, que podem não ser convertidos, por exemplo, drenando mais ainda capital da empresa.
Outra inconsistência que encontro são gestores que deixam de pagar fornecedores essenciais, para pagar bancos, por vezes, cedendo à pressão de gerentes das instituições financeiras, ou para tentar preservar o relacionamento com a instituição.
Os pagamentos prioritários, usualmente, são os funcionários, os fornecedores não substituíveis, as contas de energia, gás, telefone, internet e água, dentre outras, específicas de cada caso.
Esse erro não ocorre apenas em empresas em crise, mas também em empresas saudáveis, cujos administradores realizam investimentos incorretos, tomando dívida, assumindo custos fixos elevados, "torrando" caixa em abertura de lojas em locais de baixo fluxo, mantendo filiais não lucrativas, apostando em projetos com retornos não comprovados, acreditando em projeções mirabolantes de resultados, entradas mal sucedidas em novos mercados, subsídio a produtos sem retorno aceitável, enfim? Esses são erros que podem levar negócios a situações delicadas.
Diversificar do negócio principal -- core business -- é interessante e recomendável (antecipando ameaças externas), mas isso deve ser feito com cautela e estudo, e, ainda, sem colocar em risco a saúde financeira da empresa e, certamente, não em momentos em que o cobertor está curto.
Certa vez assessorei um cliente que estava antecipando recebíveis em FIDCs (juros elevados), e, mesmo assim, continuava investindo recursos para manutenção de uma patente, de um sistema de marcação de combustíveis adulterados para automóveis.
O custo de desenvolvimento dessa patente havia sido da ordem de R$ 4 milhões, já realizados pelo cliente, e a renovação era R$ 1 milhão. O preço de venda do sistema, para a montadora, seria de R$ 1.500 por sistema, o que encareceria o automóvel em R$ 5 mil.
Os sócios da empresa erraram ao realizar esse investimento, sem fazerem conta e sem estudarem o mercado. Explico. Para um automóvel popular, de cerca de R$ 50 mil de preço de venda, isso representa um aumento de 10% no valor do automóvel.
Considerando que um automóvel médio roda cerca de 15 mil quilômetros por ano, com consumo de 10 km/litro, temos que, por ano, o automóvel médio consumiria 1,5 mil litros, ou R$ 9 mil (custo da gasolina a R$ 6/litro).
Se considerarmos que cerca de 10% do combustível é adulterado sendo diluído em 30%, teríamos uma economia anual de R$ 270 ao dono do automóvel, que pagaria R$ 5 mil pelo sistema, ou seja, um retorno de 18,5 anos (extremamente elevado e não atrativo ao consumidor). Essa conta não foi realizada pelos sócios da empresa, antes de realizarem o investimento inicia na patente.
Por óbvio, o sistema não decolou nas montadoras, e o investimento foi perdido.
Para os mercados de carros de luxo, que até poderiam pagar por isso, não apresentam volume de vendas razoável para justificar uma linha de produção para esse sistema, e, usualmente, abastecem em postos de gasolina de confiança.
É evidente que recomendei a suspensão do gasto com a renovação da patente. Por anos o cliente havia tentado vender esse produto, e a indústria automotiva não estava interessada.
O estresse foi grande, e não foi fácil convencê-lo, pois ele achava que valeria a pena tentar mais um pouco, uma vez que o investimento incremental era "apenas" de R$ 1 milhão, frente aos R$ 4 milhões já investidos.
Entretanto, não importava quanto ele já havia investido, mesmo que fossem R$ 100 milhões, isso não faz diferença alguma. Se o investimento incremental é inviável, ele não deve ser feito, em nenhuma hipótese. No final, o cliente aceitou a recomendação, e salvamos algum dinheiro para pagar fornecedores.
O presente texto foi realizado com informações disponíveis publicamente e com base na experiência prática de seu autor, não sendo recomendação de conduta, investimento de qualquer espécie.