Por que a China influencia tanto nossos negócios e preços?
A crise chinesa já prejudica, no Brasil, o setor de mineração. Agronegócio se mantém ileso, por enquanto
Pablo Valler
O Brasil acompanha "de perto" a situação econômica da China. Muitos podem se perguntar o por quê? A potência mundial é nosso principal cliente. De todas as entregas brasileiras, 21,5% fazem a rota que passa pelos oceanos Atlântico, Índico e Pacífico até chegar ao porto de Xangai.
Em 2021, recebemos quase US$ 88 bilhões. Desses, US$ 28,8 bilhões só pelo minério de ferro. Outros US$ 27,2 bilhões com a soja. Os óleos brutos de petróleo renderam US$ 14,3 bilhões. Quase US$ 4 bilhões com a carne bovina, que tem pedidos cada vez maiores. Os dados são da Secretaria de Comércio Exterior (Secex) do ministério da Economia.
Mas, como vai ficar nosso comércio se o gigante asiático, realmente, estiver economizando, como alertam os analistas?
"O Xi Jinping [presidente do país] não tem como estratégia uma China crescendo a qualquer custo e, sim, um crescimento de qualidade. Logo, não devemos mais contar com a China crescendo 8% ou 10% ao ano", avalia Felippe Serigati, economista e coordenador do Mestrado em Agronegócio da Fundação Getúlio Vargas (FGV).
A análise revela que a chamativa desaceleração de abril, provavelmente, não tem como fator apenas a política de "tolerância zero para a Covid-19". Apesar do recente período de lockdowm realmente ter impulsionado a retração na produção industrial de 2,9%. Assim como as vendas no varejo, que diminuíram 11,1%, quase o dobro da queda prevista, que era de 6,6%.
Entretanto, é importante lembrar que o PIB do primeiro trimestre de 2022 já foi menor que o normal para os padrões chineses, alta de 4,8% na comparação anual. Quase igual ao último trimestre de 2021, de 4%.
Situação que não é boa nem para o Brasil nem para o mundo, explica Serigati: "uma China com crescimento menor gera um mundo crescendo menos. Isso impacta também o Brasil por meio de efeitos de segunda ordem sobre outras economias".
É assim com os minérios. Uma commodity produzida aqui e processada lá. Transformada em grandes conduítes ou em pequenos equipamentos para a construção civil. O setor imobiliário apresentou ontem (18.mai) a primeira queda desde 2015. De 0,11% no valor dos imóveis, segundo o Escritório Nacional de Estatísticas (NBS, na sigla em inglês).
"Logo, certamente empresas como a Vale e a Votorantim ficam mais preocupadas com essas informações", avalia Serigati. De fato, desde o início do ano a Vale tem tido dias infelizes na bolsa de valores, com quedas diárias consideradas abruptas, de até 3,9%.
O agronegócio resiste
Enquanto alguns setores estão com empresários apreensivos, o agronegócio se mantém firme e forte nas negociações. "Alimentos contam com uma demanda inelástica. Logo, mesmo que a renda não cresça tanto quanto era esperado, a demanda estará preservada". Os registros da Secex comprovam a análise. Nosso país segue batendo recordes com o envio de alimentos como a carne bovina. A média diária cresceu 34% desde o ínico do ano.
E o consumidor?
Quando uma commodity é mais ou menos exportada, as consequências são menos ou mais matérias-primas disponíveis. É como avalia o presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), José Augusto de Castro. "À medida que a demanda chinesa diminui, a tendência é que os preços desses insumos apresentem arrefecimento no mercado interno".
Mas não é de uma hora para a outra que "esse efeito pode começar a aparecer nas estatísticas de julho", prevê Castro. Claro que, até lá, outros fatores podem perder ou ganhar força, como a guerra entre Rússia e Ucrânia, que tem prejudicado as idas e vindas do comércio mundial.