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Mães contam a história: "Meu filho é autista e eu também sou"

Elas relatam como receberam o próprio diagnóstico e como lidaram com o preconceito

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Pouco se fala sobre as mulheres adultas com TEA (Transtorno do Espectro Autista). Menos ainda sobre as que são mães. Algumas acabam recebendo o diagnóstico após buscarem ajuda para os próprios filhos. Por existirem vários graus, a identificação do TEA pode passar despercebida. Estimativas baseadas em estudos do Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) - agência pública de saúde dos Estados Unidos - apontam que, no Brasil, possam existir até 2 milhões de autistas.

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De acordo com a Júlia Sargi, psicóloga e diretora técnica do Grupo Conduzir, entidade que promove condições para melhorar a qualidade de vida de pessoas com transtornos do neurodesenvolvimento, sobretudo aqueles que se enquadram no TEA, a pouca acessibilidade torna ainda maior a insegurança da mãe que também é autista. "Há uma enorme pressão da sociedade para que essa mãe se encaixe nos padrões esperados, mas é preciso entender que, mais do que incluída, a pessoa autista deve ser integrada à sociedade tendo sua condição respeitada e não moldada para se encaixar", explica.

Segundo a especialista, para a mãe autista, atividades rotineiras relacionadas aos cuidados com os filhos podem gerar um desgate grande. "O planejamento e execução de algumas tarefas como trocas de fraldas, refeições, sono, podem causar um esgotamento ainda maior do que em uma pessoa típica. A dificuldade em pedir ajuda advindo da falta de comunicação adequada dos seus próprios sentimentos podem interferir ainda mais. É fundamental ter uma rede de apoio, que se faz necessária na qualidade de vida de qualquer mãe, neurodivergente ou não", esclarece.

Para auxiliar as mães autistas, Sargi indica a terapia ABA - sigla para Applied Behavior Analysis (Análise Comportamental Aplicada). Essa técnica busca ensinar habilidades que façam diferença na vida dos indivíduos, para que sejam capazes de acessar itens, atividades e ambientes que promovam o seu bem-estar, tornando-os independentes e capazes de participar de grupos sociais. "Essa terapia é uma grande aliada dessa mulher, agora mãe, colocando de forma mais concreta e 'simples' a organização dessa trajetória na maternidade. É um suporte em momentos importantes, já que é a única ciência comprovada ao TEA", explica a psicóloga.

Mãe e filhos com autismo

A influenciadora digital Juliana Caiaffa é mãe de três filhos autistas. E foi em uma das consultas dos filhos que também recebeu a notícia: "No final do atendimento com a neurologista, ela virou e me falou: 'olha Juliana, você também é autista'. Fui encaminhada para uma psiquiatra e fiz avaliação psicológica. Como eu era igual aos meus filhos eu pensei que era normal. Eu não entendia ainda muito sobre o autismo em si", comenta.

Depois que recebeu o diagnóstico, Juliana começou a relembrar sobre os próprios sinais, que apareceram logo na infância. "Eu tenho altas habilidades, sempre me destaquei na escola, até acelerei de ano, comecei a ler precocemente e falava demais. Eu passei minha vida bem e agora eu consigo entender que já apresentava os sinais de autismo, mas na minha infância não tinham tantas informações como hoje" explica.

Juliana foi diagnosticada com TEA aos 42 anos após saber que os filhos eram autistas | Arquivo pessoal

Juliana estava com 42 anos quando recebeu o diagnóstico de TEA e, imediatamente, iniciou as terapias. "Agora que estou no meu processo de aceitação. Até então eu não tinha entendido o diagnóstico de ninguém. Penso como fui ingênua. Com terapia, me dei conta o quanto eu mascarei, eu sofri e fui abusada em vários sentidos", recorda.

Contar para a família sobre o diagnóstico não foi algo que Juliana temeu. Segundo ela, os parentes tiveram uma reação tranquila, pois entenderam que não seria algo há se preocupar tendo em vista que todos estavam se desenvolvendo bem. Por outro lado, uma das maiores dores para ela foi a parte social que envolve os filhos, especialmente o bullying. Juliana é formada em Gastronomia e Educação Física, porém hoje se dedica integralmente à divulgação de assuntos relacionados ao autismo.

"Meu esposo me deu muito suporte"

Aos 15 anos, a analista do comportamento Daniela Freitas foi diagnosticada com Síndrome de Asperger, condição que faz com que pessoa tenha dificuldade para se relacionar e se comunicar. Na época, ela se lembra que ficou muito brava porque não tinha a real noção do que isso representava. "Eu sempre buscava a normalidade, depois eu fui entender que meu esforço para ser 'normal' era bem maior do que o das outras pessoas. Tudo para seguir um padrão. Nunca suspeitei de autismo. Fugi desse diagóstico por muito tempo", diz.

Aos 23 anos, ela começou a trabalhar com um psiquiatra e ele confirmou o diagnóstico de autismo. "Eu estava casada e levei o caso para meu esposo. Ele me deu muito suporte e começou a compreender porque eu era daquele jeito. Mas a questão da familia é complexa, pois existe muito capacitismo", comenta.

Daniela e o filho Aquiles têm Transtorno do Espectro Autista em diferentes graus | Arquivo pessoal

Daniela é mãe de Aquiles, de 6 anos, que tem autismo grau 3 - forma mais grave do Transtorno do Espectro Autista e que exige maior suporte. "A rotina tem que ser muito regrada. Ele estuda numa escola especial e as terapias exigem muito", conta a mãe.

Em relação aos desafios da maternidade, ela desabafa: "Ser mãe exige muita flexibildade e as pessoas autistas tem mais dificuldade. Essa é uma das maiores dores que sinto".

Daniela tem estereotipias motoras, com movimentos repetitivos bem comuns em pessoas com autismo. Também apresenta ecolalia, que é um distúrbio do desenvolvimento da fala, cuja principal característica é a repetição de palavras ou frases ditas por outras pessoas.

Formada em Engenharia de Rede de Comunicação, Daniela resolveu mudar de área e mergulhar totalmente nos temas sobre o autismo.

Diagnóstico

O diagnóstico do Transtorno do Espectro Autista é clínico. Os sintomas mais comuns incluem dificuldade de comunicação, presença de comportamentos repetitivos e interesses restritos.

Segundo Alexandre Lucidi, médico geneticista atuante em Neurogenética e Neuroimunologia, estudos apontam a contribuição genética como um fator associado ao TEA. "Os dados de sequenciamento do genoma indicam que existem centenas de genes ligados ao TEA, embora nenhuma mutação específica seja reconhecida como exclusiva do TEA. É estimado que 400 a 1.000 genes possam estar associados a uma predisposição ao autismo. Os genes que contribuem para o TEA estão envolvidos em uma variedade de funções biológicas relacionadas ao desenvolvimento e funcionamento do cérebro", esclarece.

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