Violência na cracolândia reacende debate sobre internação compulsória
Para especialistas, medida não é a solução para o problema no centro de São Paulo
José Luiz Filho
As cenas chocantes de violência do último fim de semana na cracolândia, em São Paulo, trouxeram de volta uma discussão: a internação compulsória, medida determinada pela Justiça, é uma saída para acabar com a concentração de dependentes químicos no centro da maior cidade do país?
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Este homem viveu nas ruas do centro de São Paulo e usou drogas, na cracolândia, por três anos: "eu não conseguia parar de usar droga, aquela degradação mesmo, de verdade, andando descalço, sujo".
A primeira internação para tentar se livrar do vício foi voluntária. A segunda, teve a participação da família. A vida só mudou depois que ele encontrou uma rede de apoio. Hoje, está aprendendo uma profissão em centro mantido por uma ONG. "Já fiz curso de desenho, curso de violão, corte de cabelo, autofinanças, gerenciar seu dinheiro", conta.
Segundo um estudo da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) feito em 2021, 57,4% dos usuários frequentam a cracolândia há pelo menos cinco anos, e 39,2% costumam consumir droga no local há 10 anos ou mais.
Diante de um problema de saúde, assistência social e segurança pública, como há décadas é a cracolândia. Os especialistas concordam: a internação compulsória, aquela feita contra a vontade da pessoa, e por ordem da Justiça, não é a solução para o problema.
Para o psiquiatra e coordenador do curso de especialização em dependência química do instituto de ensino e pesquisa do Hospital Albert Einstein, Marcelo Ribeiro, é uma medida extrema.
"Qual é a grande dificuldade? Localizar esse caso grave, ir até a cracolândia, avaliar a pessoa in loco, entender que ela está muito grave e aí se possível trazê-la pra uma avaliação. Eu defendo que ela pode ser usada, mas eu não acho que a gente vai resolver a cracolândia com internação compulsória", diz o psiquiatra.
Para a coordenadora do levantamento feito pela Unifesp, Clarice Sandi Madruca, o principal não é discutir se a pessoa vai ser internada contra a própria vontade ou não. "A internação compulsória não deve ser vista como uma política, e sim como uma decisão clinica, uma decisão que vai ser feita por um profissional da saúde, um médico, avaliando caso a caso", diz a psicóloga.
Ela defende a oferta de alternativas de renda e estudo para recuperar a vida do dependente: "as estratégias de recuperação a longo prazo são bem mais importantes e vitais para esse tipo de população do que ficar nesse debate de qual vai ser a primeira saída, a primeira porta de entrada pra assistência dele".
Para quem já está no caminho, não há dúvida: "eu cheguei ali, no fundo do poço, vi muita gente morrendo, era para eu estar morto numa hora dessa, não tem amigo, lá dentro, por um simples pedacinho de crack, a pessoa mata o outro".
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