Feminismo negro: lutas das mulheres negras e a diferença do movimento
Mulheres negras representam 52% das vítimas de assédio sexual no Brasil
SBT News
De Lélia Gonzalez a Djamila Ribeiro, grandes nomes do feminismo negro brasileiro devem ser lembrados para compreender a lutas das mulheres negras. "Se eu luto contra o machismo, mas ignoro o racismo, eu estou alimentando a mesma estrutura", diz Djamila. Essa afirmação segue de encontro com o debate entre o feminismo e o feminismo negro. Para compreender melhor a interseccionalidade, junção de raça e gênero, o SBT News entrevistou algumas mulheres negras.
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Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia, mulheres negras correspondem a 28% da população brasileira. Historicamente, a vida das mulheres, negras e brancas, foi destoante. Enquanto, parte delas sofriam com as marcas da escravidão aliadas ao machismo, as outras eram vítimas apenas da sociedade patriarcal. A fundadora do Instituto do Protagonismo Feminino, Alexandra Loras, explicita a diferença entre os feminismos: "enquanto a mulher branca luta para poder trabalhar, a mulher negra já chegou trabalhando escravizada, de graça".
Alexandra alerta sobre a exploração sofrida por mulheres negras, já que muitas vezes para uma mulher branca ir trabalhar, ela explora uma mulher negra ou várias para cuidar do seu lar e dos filhos. Em 1989, Kimberlé Crenshaw, teórica feminista e professora estadunidense especializada em questões de raça e gênero, trouxe o conceito de interseccionalidade: "Forma pela qual o racismo, o patriarcalismo, a opressão de classe e outros sistemas discriminatórios criam desigualdades básicas que estruturam as posições relativas de mulheres, raças, etnias, classes".
Kátia Araújo, National Artist da MAC Cosmetics, também corrobora com a opinião que o recorte racial vai além da perspectiva de gênero. O racismo estrutural é o ponto de separação e da invisibilidade das dores das mulheres negras no feminismo. "Se traçarmos um paralelo entre mulheres não negras e mulheres negras, outras questões específicas atribuídas à racialização trarão uma realidade mais excludente e violenta à essa mulher negra", complementa Araújo.
Outro ponto importante a ser observado é que mulheres negras sofrem mais assédio que mulheres brancas. Conforme levantamento divulgado pelo LinkedIn e pela Think Eva, as maiores vítimas de assédio sexual no País são as mulheres negras (52%). Na visão da psicóloga Larissa Ribeiro, esse número vem do processo de escravização, em que dezenas de mulheres escravizadas foram abusadas e a prática continuada, por exemplo, com empregadas domésticas. Ela ainda acrescentou sobre a "construção social das mulatas", remetendo a características sexuais.
O passado traz tristes consequências a vida das mulheres. A fundadora do Instituto do Protagonismo Feminino reflete sobre a temática de abuso sexual e traz à tona, em palavras, o histórico deste cenário ao citar os principais pontos abusivos com o público feminino: "a objetificação e hipersexualização do corpo da mulher negra que foi estuprado, abusado, explorado e escravizado por séculos".
E por falar em consequência, é necessário citar que grande parte dos impactos negativos e traumas são causados ainda nos primeiros anos de vida, durante a infância, muita das vezes por não se sentirem representadas ou por serem alvos de comentários maldosos pela cor da pele, características físicas e cabelo.
O movimento do feminismo negro atua exatamente para a conscientização frente a essas situações, além de claro, mostrar a força da mulher negra independente da situação ou característica pertencente a ela. Apesar disso, é importante "entender que não cabe somente a pessoas negras ou a mulher preta o papel de letrar a todos nesta pauta", alerta Kátia Araújo.
Mas afinal, existe diferença entre feminismo e feminismo negro?
Apesar do objetivo ser aparentemente igual por ambos se tratar do empoderamento feminino, há, sim, diferença nos movimentos. Antes de entrar nas diferenças, é importante destacar que o feminismo se trata de uma ação na qual as mulheres conseguem, através dela, dar voz a suas vontades e direitos em uma sociedade na qual os homens sempre foram destacados independente da situação ou posição. O discurso feminista não se trata de algo contra os homens, mas sim a favor das mulheres e seus direitos quanto pessoa.
Se tratando do assunto e sua divisão entre feminismo negro e feminismo, a psicóloga Larissa destacou que existe diferença entre os dois e, para além disso, o movimento, de modo geral, possui diversos sub grupos com pautas diversas, que é onde encontramos o liberal, radicalm intrerseccional, negro, entre outros.
De acordo com a especialista, "foi notado que o que formou o movimento lá no fim do século XIX não abarcava todas as mulheres, tendo seu direcionamento para brancas e burguesas. A criação de outros espaços, como é o caso do feminismo negro, se deu porque muita das vezes essas mulheres não eram ouvidas naquele cenário inicial.
Os relatos corroboram para a importância do tema não só no Dia da Consciência Negra, mas para uma conscientização, como explica Araújo ao reforçar que a luta por igualdade deve ser universal e em todos os dias do ano, não somente no mês de novembro. "Temos que falar sobre isso, promover discussões a todo tempo. Conscientizar que essa é uma pauta para todos, que todos têm seu lugar de fala, sendo protagonistas ou coadjuvantes. Façamos cada um, nossa parte! A visão plural de mundo traz inovação, proporcionando menos desigualdade e violência", comentou ela.