Medo em falar de saúde mental no trabalho? ESG pode quebrar o tabu
Movimento pela sustentabilidade das corporações impulsiona programas de cuidado aos colaboradores
Pablo Valler
Assim que o século 21 começou, muitas previsões foram feitas. Uma delas chamou mais atenção. Até porque interferiria em muitas vidas, tanto no âmbito pessoal quanto no profissional. Estamos falando de saúde mental, que seria o principal mal a assolar a humanidade até 2100, de acordo com uma projeção da Organização Mundial de Saúde (OMS). De fato, um levantamento de 2019 mostrou que já são mais de um bilhão de pessoas sofrendo de transtornos como, por exemplo, depressão e ansiedade.
Um quarto de século passou e pouco se fez, em grande escala, para reverter a situação. Mas, atualmente, um movimento mundial pode fazer diferença: o ESG. O tão exigido impacto postitivo que as empresas devem gerar no meio ambiente, sociedade e governança corporativa não faria tanto efeito se as corporações não se ocupassem em conhecer e melhorar o quadro de saúde mental dos funcionários.
Não é uma tarefa fácil, dizem especialistas. Porque o ideal seria ter começado a abordar saúde mental na educação de base. Ou seja, com as crianças. Só assim se evitaria o preconceito da fase adulta. Então, para as empresas interessadas em começar um programa de saúde mental, não há outro jeito: "É preciso investir na educação desse conceito como parte da cultura organizacional", avisa a gerente-sênior de Recursos Humanos da Nestlé, Márcia Bertolini.
A visão é apoiada no que orienta o primeiro programa de saúde mental do mundo, o Mente em Foco, do Pacto Global da Organização das Nações Unidas (ONU). No Brasil, a porta-voz Flávia Vianna conta que "tratar é um processo construído diariamente pelas empresas. Não é da área de sustentabilidade, de ESG e nem de RH. É preciso que todas as áreas estejam envolvidas e entendendo o desafio que é, mas também a oportunidade que é trabalhar com saúde mental. Reduzindo o preconceito, sem receio de ser procurado como apoio e de buscar ajuda, se preciso".
Já que se fala em educação, porém, sem professor, quem faria o papel daquele que serve como exemplo, que demonstra não ser um problema falar do assunto? Sim, o líder. Aliás, líderes tem mais influência do que terapeutas sobre as vidas das pessoas - em uma comparação de 69% a 31%, respectivamente, revelou uma pesquisa realizada com três mil pessoas pela consultoria internacional Workforce.
A Nestlé começou seus programas desse modo: "Trouxemos os líderes. Falamos sobre o problema, que era um tabu. Identificamos os sintomas e assumimos de frente. Ajudamos todos a se expressar, porque muitos tem dificuldade em assumir que tão precisando de ajuda nesse sentido", conta Márcia. "É preciso criar um ambiente de segurança psicológica. O colaborador precisa se sentir à vontade para falar que 'hoje não tô bem, só quero chorar', por exemplo".
"Por isso é importante treinar o líder", complementa Dante. "Porque pelo histórico, sabemos que há mais chance do líder ser patológico, tóxico". Esse processo pode ser longo e também tem chances de não funcionar, a depender do perfil do líder. Por isso surgem empresas para atender outras empresas que precisam de uma evolução no tratamento da saúde mental dos colaboradores, como a ZenKlub. A CRO, Maria Barreto, conta que percebe envolvimento maior do chamado C-Level (CEOs, CFOs, COOs). "Eles perceberam que é importante cuidar dos colaboradores. Pra evitar um adoecimento geral e o custo que isso gera", relata.
"Ainda é importante observar as diferenças que podem existir dentro de uma mesma empresa. Às vezes, com o mesmo programa de saúde mental você consegue um resultado ótimo em um setor e péssimo em outro. Por isso tem que sempre mensurar. Qual conteúdo tá gerando valor e qual não tá e etc. As empresas já entenderam que é importante, mas ainda tão se confundindo em como fazer", analisa Maria.
A chance para alcançar o mais alto nível de eficiência em programas de saúde mental pode estar no ESG, segundo Dante. "Simplesmente porque o ESG une aspectos antes considerados diferentes. Esse foco mais abrangente da sustentabilidade, que não é só meio ambiente, pode ajudar a entender e gerar mais resultado na saúde mental. Porque se vê impactos internos e externos e cuida das pessoas em sua totalidade".
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