La Niña no fim e El Niño à vista: entenda as mudanças no clima
Sistema de chuvas deve voltar à neutralidade e ter a outra influência na primavera
Pablo Valler
No fim de 1999, o Oceano Pacífico demonstrava que os ventos alísios, que correm na linha equatorial sentido oeste, estavam tão fortes que descobriam as águas mais frias, do fundo do mar. Sinal de La Niña, que se confirmou pouco tempo depois.
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O vídeo da Agência Americana Oceânica e Atmosférica (NOAA, na sigla em inglês) mostra essa linha do tempo, com a temperatura da água mudando. Assista:
Essa condição climática, de fortes ventos sobre a água do mar, gera nuvens volumosas que correm a faixa do Equador espalhando chuva. No Brasil, onde estão o nordeste e o norte. A concentração nessas regiões significa menos chuva para o sul.
A consequência altera a rotina nas zonas rurais. Estados como Pará, Tocantins, Maranhão, Piauí e Bahia experienciam alta umidade, que ajuda no desenvolvimento de plantas e animais. Porém, os manejos são dificultados, por exemplo, por alagamentos. Já Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul enfrentam estiagem. O La Niña dura, geralmente, entre nove e 12 meses. Mas, o atual já tem mais de três anos.
O fim era esperado. Especialmente no estado gaúcho. O prolongamento da secura fez o solo chegar, hoje em dia, a um dos menores níveis de umidade da história, conforme a Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural (Emater-RS). Está entre 10 e 30%. Abaixo de 50% já é considerado ruim para a agropecuária.
Resultado: algumas lavouras de soja e milho chegaram a 70% de perdas. O prejuízo é de quase R$ 12 bilhões, de acordo com levantamento da Federação das Associações de Municípios do RS (Famurs). Até a semana passada, 317 municípios decretaram situação de emergência à Defesa Civil. Destes, 191 já tiveram a situação homologada pela União e devem receber recursos.
O fim, o meio e o começo de outro fenômeno
Agora, as diversas formas que a meteorologia de todo o mundo tem para monitorar os oceanos, os ventos e as temperaturas mostram uma normalização no Pacífico, conta a meterologista Eliana Gatti, da ClimaTempo.
"O La Niña está enfraquecendo aos poucos. Algumas áreas [do oceano], da costa oeste da América do Sul, já se encontram com anomalias positivas de temperatura. De acordo com o consenso de grandes teóricos dos Estados Unidos, a probabilidade de entrar em neutralidade ainda neste semestre é de 85%", informa.
No entanto, esse período não deve durar tanto. Em torno de quatro meses. Na primavera há grandes chances do efeito contrário ao La Niña surgir, o El Niño, que é quando as águas do Pacífico esquentam com ventos mais distribuídos, que também espalham as nuvens. "Então, a tendência é que não tenhamos aquele frio tardio", destaca Eliana, lembrando que também seria uma situação ruim para a produção de alimentos. Só que "há chances, para o sul, de mais tempestades".
Ainda assim, geralmente é melhor para a agropecuária sulista, lembra o meterologista Francisco de Assis: "a umidade aumenta e há chance de safra de alta produtividade", lembra. Foi assim quando o Brasil bateu recordes seguidos -- e com folga -- de produtividade.
Menos chuva, mais ondas de calor
Entretanto, a atuação do La Niña freava um pouco as ondas de calor provenientes do aquecimento global, destaca a Organização Meteorológica Mundial: "o resfriamento provocado pelo longo episódio de La Niña conteve, temporariamente, o aumento das temperaturas mundiais, apesar de o período dos últimos oito anos ter sido o mais quente já registrado", alerta o secretário-geral da OMM, Petteri Taalas. "Se agora entrarmos em uma fase de El Niño, é provável que haja outro aumento das temperaturas mundiais", acrescentou.