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Entenda por que modelo de transição energética pode ser injusto com países subdesenvolvidos

Pauta sobre transição é um dos pontos centrais da COP30 e prevê a substituição gradual do sistema energético de combustíveis fósseis para energia limpa

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Antonio Guterres e o presidente Lula - Reprodução governo
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A 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP30), realizada em Belém, no Pará, entra nesta terça-feira (11) no segundo dia de negociações para adaptação climática, sobretudo o plano para transição energética.

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🔍A transição energética é a mudança gradual do sistema energético de combustíveis fósseis, como o petróleo e o carvão mineral, por fontes limpas e renováveis, como energia solar, eólica e hidrelétrica. O objetivo é reduzir as emissões de gases de efeito estufa, que aceleram o aquecimento da Terra.

Para Daniel Caiche, professor do MBA em ESG e Sustentabilidade da Fundação Getúlio Vargas (FGV), que está na Conferência cumprindo agenda profissional, há otimismo em relação à efetividade das discussões sobre a transição energética. No formato atual, os países mais ricos financiam os mais pobres. Ainda assim, o professor explica que há pontos que podem travar o avanço da pauta.

Exemplo disso é o argumento de que o modelo debatido na COP30 não é justo. Para nações subdesenvolvidas, os Estados Unidos e a China, os maiores poluentes de gases, enriqueceram e puderam melhorar serviços públicos, como saúde, segurança e educação, diferente deles. “É difícil falar de transição energética quando falta acesso a serviços básicos”, disse Daniel Caiche.

Outro desafio é o cenário geopolítico. Os Estados Unidos, um dos principais atores globais na agenda climática, não enviaram representantes à COP30. Já China e União Europeia trocam acusações sobre o nível de investimento de cada um na transição. Representantes de ambos também não conseguiram cumprir metas do Acordo de Paris, que visa conter o aquecimento global.

A seguir, veja os principais pontos que o professor Daniel Caiche falou com o SBT News.

O atual modelo para transição energética é injusto?

"Essa é uma ótima pergunta, eu acho que a gente vai falar muito sobre isso nos próximos dias. É difícil contra-argumentar ou não achar justo o argumento desses países subdesenvolvidos.

Os países desenvolvidos do Norte Global se desenvolveram a partir da queima de combustíveis fósseis. E agora que está na vez dos países subdesenvolvidos de enriquecer, eles não vão poder usar? Então, faz sentido.

O problema é que a gente tá vivendo uma emergência climática e a gente não pode mais continuar emitindo os gases de efeito estufa.

É difícil falar em transição energética enquanto tem pessoas passando fome, pessoas sem os direitos mínimos de saúde, de educação e isso se consegue a partir da geração de riqueza. Agora, acredito que há outras possibilidades de riqueza ao invés de reforçar o discurso do uso de combustíveis fósseis.

Por exemplo, há modelos como o fundo árabe que faz um grande projeto para recuperar áreas e pastagens degradadas, inclusive no Brasil."

📋 O Mubadala é um fundo soberano dos Emirados Árabes Unidos, com sede em Abu Dhabi, que investe globalmente em diversos setores como tecnologia, energia renovável, aeroespacial e infraestrutura. Ele busca gerar retornos financeiros sustentáveis para o governo de Abu Dhabi e apoiar a diversificação da economia do país.

"Com o tempo, essas terras perderam a capacidade de produção. O fundo está adquirindo essas áreas para plantar macaúba, por exemplo, uma espécie, uma palmeira nativa do Brasil típico do Cerrado, e que tem um alto potencial de gerar óleo para biodiesel."

Leia mais sobre a COP30:

Qual o impacto da ausência dos EUA na COP30?

"Tanto os Estados Unidos como a China investem em energias limpas e possuem empresas e setores da sociedade civil que são comprometidos com a agenda climática. O governador da Califórnia, por exemplo, está em Belém. Têm empresas multinacionais norte-americanas que vão apresentar resultados de descarbonização também.

Então, não é que os Estados Unidos está fora. Oficialmente, o país não se posiciona, não assume a meta e realmente, então, isso é um impacto. Não podemos negar. Por isso, acredito que esse é o momento para os países pressionarem as lideranças chinesas e norte-americanas.

A China, por exemplo, faz um grande esforço para liderar a transição, por exemplo, de componentes e equipamentos para geração de energia solar. Ao mesmo tempo, estão ampliando a prospecção e o uso de combustível.

Então, ela consegue baratear o custo de produção dos equipamentos de geração de energia a partir da via solar. Isso já é uma parte da transição. Mas o ideal seria que ela tivesse se afastado dos combustíveis fósseis, mas ela não está fazendo isso.

Então, é uma contradição. Não é o melhor, mas mesmo assim, isso tem um impacto positivo. Então, não é de se negar, é muito importante que ela esteja fazendo isso. Por isso, acredito que há espaço para resultados positivos nas discussões sobre transição energética. Vejo com otimismo."

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Há alguma contradição do governo em relação a transição e a pesquisa na Foz do Amazonas?

"Acredito que haja contradição. E é preciso lidar com essa contradição. Ao mesmo tempo que o país tem feito esforços para reduzir suas emissões de gás de efeito estufa, tem apresentado bons resultados, ele continua mapeando o mercado de petróleo."

📋 O Ibama autorizou a Petrobras a realizar uma pesquisa exploratória de petróleo na região da Margem Equatorial, na Foz do Amazonas. A licença é exclusiva para a fase de pesquisa e não autoriza a produção. Essa permissão, concedida em outubro de 2025, visa avaliar a existência de petróleo na área antes que um novo processo de licenciamento seja iniciado, caso a pesquisa seja positiva.

Por outro lado, eu não acho que seja correto também abandonar a pesquisa sobre novos campos de exploração. Primeiro, o petróleo é um recurso muito importante para nossa sociedade.

Hoje, ele é muito utilizado para produção, por exemplo, de medicamentos, de pneu de avião. Então, tem alguns materiais que ele ainda é importante ser utilizado.

Então, a gente sabe que tem petróleo no Brasil, enquanto humanidade, é bom para o desenvolvimento do país. Acredito que faz sentido a Petrobras continuar pesquisando.

Agora, essa questão do licenciamento forçado do Ibama, por exemplo, tem relação com a política. E isso pode, também, dificultar a análise técnica.

O presidente Lula está sofrendo pressões dos governadores, dos prefeitos. Eles têm interesse nos royalties que o petróleo vai gerar para a sua cidade, para os seus estados, pensando no desenvolvimento que esse dinheiro vai trazer para aquela população."

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